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A falácia do planejamento e o planejamento estratégico

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Monise Carla

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Auditora Líder ISO 9001:2015, ISO 22000:2018 e ISO 31000:2016. Redatora do Blog da Qualidade e Especialista de Comunicação no Qualiex! Eu ajudo profissionais a resolverem problemas de qualidade por meio de tecnologia e acredito que esse é o primeiro passo para uma vida de Excelência. Gosto de rock, desenho animado e vejo qualidade e excelência em tudo isso. Não me leve tão a sério no Twitter, mas se preferir, você também pode me encontrar no Facebook e Linkedin.

É natural que em épocas de fim e começo de ano, pessoas e empresas estejam dedicando tempo e energia no planejamento estratégico. Eu também estou praticando esse exercício, e sinceramente, é muito bom fazer reflexões de aprendizados e planos futuros a serem realizados. 

Este ano, aproveitando o movimento do Divertimento Estratégico, onde estamos abordando muito a consistência, também estou buscando definir metas mais “pé no chão”. 

Desta forma, lembrei de um livro que lemos no clube do livro da ForLogic em 2021, o clássico Rápido e Devagar do Daniel Kahneman. No capítulo 23, Visão de Fora, Kahneman aborda o que ele chama de Falácia do Planejamento. E é com esse tema que espero enriquecer o seu planejamento estratégico para que ele seja a prova de balas! 

Um caso vivido por Daniel Kahneman 

Daniel Kahneman conta uma experiência que ele teve com o Ministério de Educação de Israel, ao desenvolver um projeto de construir uma grade curricular que incluísse formação de juízo e tomada de decisão no ensino médio.  

Após um ano de projeto e um progresso significativo, de acordo com a avaliação da equipe, o time havia estimado que para terminar uma primeira versão seria necessário pouco menos de 3 anos.  

Entretanto, quando lembraram de outros projetos que se pareciam com esse, entenderam que: 

  • Os projetos parecidos nem sempre chegavam a ser concluídos. A estimativa era que 40% destes projetos fracassavam. 
  • Do percentual que havia terminado os projetos, o tempo mínimo para concluir era de 7 anos 

A partir dessas informações, imaginamos que o grupo havia reconsiderado a estimativa atual e então, reconsiderado o projeto. Mas não foi o que aconteceu. O time continuou no projeto ainda otimista que “seria diferente dessa vez”. 

Infelizmente, não foi o que aconteceu. O projeto levou 8 anos para ser concluído. 

O que é a falácia do planejamento? 

Ao avaliar a situação, Kahneman já percebeu que esse fenômeno não só aconteceu neste projeto, mas acontece em muitos lugares o tempo todo. Assim cunharam esse fenômeno como a “Falácia do Planejamento”. 

A falácia do planejamento consiste em planos e prognósticos que: 

  • estão irrealisticamente próximos de hipóteses super otimistas 
  • podem ser melhorados com uma consulta às estatísticas de casos semelhantes 

Desta forma, podemos dizer que a falácia do planejamento considera estimativas de tempos de conclusão de tarefas mais otimistas do que os encontrados em projetos semelhantes já realizados. Ou seja, a tendência de subestimar o tempo, os custos e os riscos de ações futuras e, ao mesmo tempo, superestimar os benefícios das mesmas ações. 

No livro ele também traz diversos casos em que isso aconteceu em empresas, governos, e projetos pessoais. 

O que isso tem a ver com o planejamento estratégico? 

Ao ler, de maneira teórica e estudiosa, pode até passar pela nossa cabeça algo tipo: “nossa, mas não tem como errar, eles foram muito cegos, os dados estavam ali na cara deles!” 

Quando comecei a pensar dessa forma, já me veio na cabeça que, só em 2022, eu cometi esse equívoco em pelo menos 5 projetos significativos, incluindo pessoais e profissionais. Isso porque eu já tinha lido o livro, rs. Se eu for considerar todo o histórico, certamente não conseguiria contar. 

Bom, tudo bem. Não é um espaço para culpas. A questão é que nós muitas vezes tendemos a pensar muito em nós mesmos, nossa disposição no momento ou o quanto desejamos nos dedicar a determinado projeto. Entretanto, esquecemos de olhar movimentos históricos ou até outros fatores externos que podem influenciar nos resultados. 

Vejo muitas vezes as empresas fazendo isso ao analisar o próprio contexto da organização, requisito 4 da ISO 9001. Ao elaborar uma SWOT, intensifica muito pontos fortes e fracos (fatores internos) e as oportunidades e ameaças (fatores externos) são feitos de maneira muito superficial. Em alguns casos, até para “inglês ver”. 

Não só aí, mas podemos cometer isso em projetos internos, com clientes e qualquer outra parte interessada. Gestores e operacionais são responsáveis. 

“Os autores de planos irrealistas com frequência são movidos pelo desejo de conseguir que o plano seja aprovado — por seus superiores ou por um cliente —, e aproveitando-se do fato de saberem que projetos raramente são abandonados inacabados meramente devido a custos extras ou prazos estourados. Em tais casos, a maior responsabilidade de evitar a falácia do planejamento recai sobre os tomadores de decisão que aprovam o plano. Se eles não reconhecem a necessidade de uma visão de fora, cometem uma falácia do planejamento.” 

Kahneman, Daniel. Rápido e devagar (pp. 387-388). Edição do Kindle. 

Já pensou que isso pode colocar em xeque todo o planejamento estratégico da sua organização? 

Mitigando a falácia do planejamento 

Tudo bem, não é terra arrasada. Evitar a falácia do planejamento está relacionada a entender o histórico de tempo, custo e riscos de outros projetos. Consolidar as famosas “lições aprendidas” que vemos em boas práticas de projeto. 

Quando se trata de projetos inovadores, podemos buscar os benchmarks também. No livro, Kahneman traz 3 passos para fazer isso: 

  1. Identifique uma classe de referência apropriada com o seu projeto;
  2. Obtenha as estatísticas da classe de referência. Use as estatísticas para gerar uma previsão;
  3. Use informação específica sobre o caso para ajustar a sua previsão, se houver motivos particulares para esperar que o viés otimista seja mais ou menos pronunciado nesse projeto do que em outros do mesmo tipo. 

Por exemplo, se é um desenvolvimento de um novo produto. Já desenvolvemos novos produtos antes? Qual foi o prazo? Tamanho da equipe? Quanto investimos? A partir dessas informações, volte ao projeto atual e avalie de novo, ajustando o que for necessário. 

Tudo o que precisamos é racionalizar o planejamento, tirando um pouco do viés otimista (uma fonte potencial de risco). 

Isso significa que só podemos fazer um planejamento no modo pessimista? Não!  

No momento criativo emoções, ideias, desejos, a disposição e a vontade devem estar presentes! Entretanto, na racionalização do projeto, nos prazos, orçamentos, nossa visão deve ser mais racional para garantir que os planos tragam os resultados necessários em tempos oportunos.  

E racional não o mesmo que pessimista, e sim REALISTA. Mas um cenário pessimista também ajuda a construir boas projeções. 

Por exemplo, confiar que uma nova linha de negócio é capaz e trazer 20% do faturamento da empresa no primeiro semestre pode parecer sedutor. Embora a meta seja S.M.A.R.T., não significa que será atingida. 

Contudo, se não considerarmos a curva do aprendizado que o time levará, o ciclo de venda, a consolidação do processo, necessidade de outros investimentos e vários outros riscos, pode ser que isso comprometa as metas da empresa. 

Um processo que garanta melhores estimativas de projetos 

Bom, eu já até citei ali que acabei cometendo a falácia do planejamento mesmo depois de ter conhecimento do termo e seus impactos. Por que isso acontece? Eu acredito que não podemos tratar isso como um fenômeno eventual, ou pontual. As ferramentas para mitigar esse risco deve estar incorporada no processo. 

Nem sempre será possível fazer estudos profundos sobre o assunto. Embora, se você tiver um software de gestão que forneça informações confiáveis de maneira acessível, você terá melhores ferramentas para um planejamento mais racional. 

Quando não é possível acessar informações deste grau, você pode fazer boas perguntas que te ajudarão a evitar esse tipo de situação, como por exemplo: 

  • Já fizemos algum projeto parecido com esse na empresa? 
  • Algum fornecedor ou cliente, já executou algo parecido? 
  • Há casos divulgados no mercado desse tipo de projeto? 
  • Quanto tempo foi necessário? 
  • Quanto de recurso foi necessário? 

Isso já ajudará a pelo menos investigar se existe conhecimento na equipe, ou no seu círculo de relacionamento. Se isso não existe, talvez você possa aplicar princípios da metodologia ágil para validar seu projeto. Experimentando e avaliando projetos semana a semana e atualizando o planejamento com base nos avanços dos projetos. 

Portanto, garantindo um padrão de evolução do projeto semanalmente, você poderá ter um pouco mais de previsibilidade.  

Se você é ouvinte do Qualicast, já deve ter entendido que o planejamento estratégico é um processo. Talvez seja um bom ponto de melhoria a aplicar nesse processo! 

Tem algum projeto aí que precisa ser revisto para mitigar a falácia de planejamento? 

 

Referência 

KAHNNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: duas formas de pensar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011. 

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4 comentários em “A falácia do planejamento e o planejamento estratégico”

  1. SIDNEI SILVA DE OLIVEIRA

    Parabéns Monise, seus conteúdos compartilhados enriquece demais nossos conhecimentos…

  2. Reginaldo Batista

    Excelente artigo Monise, está muito bem detalhadas as características da falácia do planejamento.

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